Revista Estrutura - edição 5 - page 21

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ção de Vasconcelos para a engenharia é
imensa e, por possuir esse caráter mul-
tidisciplinar, emblemática.
O enfrentamento da complexidade
sugere uma reorganização do pensa-
mento como fio condutor capaz de
provocar um outro olhar sobre as ques-
tões que se colocam no mun-
do atual. Essa reorganização
também se aplicaria sobre a
engenharia estrutural, onde
um objeto de análise poderia
ser compreendido por seus
múltiplos atributos, inseridos
em um sistema de aglutina-
ção multidisciplinar. Atribu-
tos que se encontram nos
diversos campos do conheci-
mento além da própria enge-
nharia, como a arquitetura, a
história, a arte e a biologia, e
que a própria história do de-
senvolvimento das teorias es-
truturais confirma, com, por
exemplo, o surgimento da as-
sociação dos esqueletos de
animais ao sistema portan-
te das edificações, sugerido
por Perronet no século XVIII.
Esse passo multidisciplinar,
associando engenharia e bio-
logia, garantiu a possibilidade
de abstração de um sistema
estrutural, gerando futura-
mente o que seria conhecido como a
estrutura independente. A engenharia
estrutural, como entendeu Vasconce-
los, não é uma ciência isolada, ao con-
trário, está profundamente vinculada
a outras disciplinas que vão da ciência
dos materiais ao desenvolvimento da
arquitetura, passando pela ecologia, a
economia e as ciências sociais, entre
outras. Acima de tudo é uma ciência in-
serida em um processo histórico.
Ao citar o princípio de Pascal, Morin
aponta para uma reforma do pensamen-
to como resposta possível para o enfren-
tamento da complexidade:
“Como todas as coisas são cau-
sadas e causadoras, ajudadas e
ajudantes, mediatas e imediatas,
e todas são sustentadas por um
elo natural e imperceptível, que
liga as mais distantes e as mais
diferentes, considero impossível
conhecer as partes sem conhe-
cer o todo, tanto quanto conhe-
cer o todo sem conhecer, particu-
larmente, as partes”.
5
O trabalho de Vasconcelos consegue
abordar o todo em uma área do conhe-
cimento que cada vez mais se concentra
nas partes, por isso sua fundamental
importância. Seu trabalho de amplitude
multidisciplinar, serve de alerta para o
fato de que a superespecialização das
profissões reforça a fragmentação de
conhecimentos, a separação de discipli-
nas e a criação de fronteiras de conhe-
cimento, frente às quais não devemos
nos acomodar. Para Morin:
“A fronteira disciplinar, sua lingua-
gem e seus conceitos próprios
vão isolar a disciplina em relação
às outras e em relação aos pro-
blemas que se sobrepõem às dis-
ciplinas”.
6
A contribuição de Vasconcelos é, por-
tanto, de grande importância para a
formação acadêmica em cursos de en-
genharia, principalmente em níveis de
graduação, em função da existência de
5 MORIN, Edgar.
A cabeça bem-feita
. Rio de Ja-
neiro: Bertand Brasil, 2003, p. 88.
6 Ibidem, p. 106.
um certo isolamento do conhecimento
técnico em relação às outras áreas do
conhecimento. A própria história da en-
genharia no Brasil, tão bem documen-
tada e analisada por Vasconcelos, tem
sido negligenciada em prol da ênfase
técnica tão necessária aos cursos de
graduação, com consequên-
cias danosas para a forma-
ção de jovens profissionais,
que chegam ao mercado de
trabalho sem a compreensão
de seu papel no processo de
desenvolvimento histórico e
social do país.
FORMAÇÃO E
ATUAÇÃO
Augusto Carlos de Vas-
concelos nasceu no Rio de
Janeiro em 1922 e mudou-
-se posteriormente para São
Paulo. Na Escola Politécnica
da Universidade de São Pau-
lo formou-se engenheiro Me-
cânico-Eletricista em 1946
e Engenheiro Civil em 1948.
Foi também professor uni-
versitário na EPUSP, FEI, FAU
e EEUM. Recebeu uma bolsa
da Fundação Alexander von
Humbolt e, entre outubro de
1954 e dezembro de 1955,
estudou em Munique, Alemanha, onde
preparou sua tese de doutorado com
o título
Modelos Armados Fotoelásticos
para Estudo da Aderência entre Aço e Con-
creto
, tendo como um dos orientadores
o Prof. Hubert Rüsch
7
.
Em 1956, de volta ao Brasil, Vascon-
celos promoveu um curso livre extra-
curricular na EPUSP, onde traduziu para
um grupo de 150 alunos de engenharia
as aulas de concreto protendido que ti-
nha assistido em Munique, ministradas
pelo Prof. Rüsch, proporcionando desta
forma a difusão de conhecimento ne-
cessária à implantação deste material
como possibilidade estrutural no Brasil.
Nas décadas de 1970 e 1980, participou
da elaboração de diversas normas téc-
7 Hubert Rüsch : professor emérito da Uni-
versidade de Munique, desenvolveu teorias
para a aplicação do concreto protendido,
material que mais tarde seria largamente
utilizado nos projetos estruturais que viabi-
lizariam várias obras da Arquitetura Moder-
na Brasileira.
INTERESSE POR DIFERENTES ÁREAS TRADUZIDO NUM LIVRO
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