Revista Estrutura - edição 7 - page 8

REVISTA ESTRUTURA
| MAIO • 2019
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forma de Concessões, Parcerias Públi-
co-Privadas (PPPs) entre outras ações
conjuntas, e essas políticas públicas tem
que ser aceleradas. Basta recordar os
recentes leilões de privatização dos ae-
roportos, portos e da Ferrovia Norte Sul
que tiveram surpreendentes resultados.
A área imobiliária é preponderante, mas
necessita de crédito abundante e aumen-
to de renda para a população.
ABECE – Além das questões econô-
micas, quais os demais desafios en-
frentados pela indústria de cimento
no Brasil?
Paulo Camillo –
Nos dias atuais, o maior
desafio diz respeito às questões ambien-
tais relativas às mudanças climáticas, cuja
legislação é cada vez mais abrangente e
restritiva. Como a complexa indústria do
cimento é intensiva em capital, energia e
consumo de matérias primas, o proces-
so de produção naturalmente apresen-
ta emissões, mais particularmente CO
2,
exigindo constante e redobrada atenção
com o meio ambiente. Daí a antiga e gran-
de preocupação e mobilização global do
setor com as questões ambientais de
modo a reduzir a sua pegada de carbono,
em linha com a Comissão Mundial sobre o
Meio Ambiente e o Desenvolvimento esta-
belecida em 1987 pela ONU, Organização
das Nações Unidas, que ficou conhecida
como
Comissão Brundtland
, por ter sido
presidida pela então primeira-ministra da
Noruega, Gro Bruntdland, cujo objetivo
era estudar a relação entre o desenvol-
vimento econômico e a conservação do
meio ambiente. Para nosso setor, significa
investir em medidas de eficiência energé-
tica e intensificar o uso de matérias-pri-
mas e combustíveis alternativos.
ABECE – Como está essa questão no
Brasil?
Paulo Camillo –
Em virtude de esforços
realizados há décadas, a indústria brasi-
leira do cimento registra um dos menores
níveis mundiais de emissão de CO
2
por
tonelada produzida. Além disso, somos
o segundo país do mundo a lançar o Ma-
peamento Tecnológico do Cimento, deno-
minado
Roadmap Brasil
sobre mitigação
das emissões de CO
2
no processo de fa-
bricação de cimento até 2050. Produzido
em parceria com a Agência Internacional
de Energia (IEA) e a Iniciativa de Sustenta-
bilidade do Cimento (CSI), tendo suporte
técnico e cofinanciamento do Banco Mun-
dial, esse estudo identificou alavancas
para redução de emissões em médio e
longo prazos, ancorada em 4 pilares: efi-
ciência energética, uso de adições para
redução da quantidade de clínquer no ci-
mento, uso de combustíveis alternativos,
em substituição aos combustíveis fósseis
não renováveis e inovação tecnológica
pela captura e estocagem de carbono. O
mencionado documento foi apresentado
oficialmente às autoridades brasileiras no
último dia 03 de abril em evento na Con-
federação Nacional da Indústria (CNI), em
Brasília, que reuniu cerca de 100 profissio-
nais ligados à questão, junto com ONGs,
membros do parlamento e lideranças em-
presariais.
ABECE – Teme uma possível perda de
hegemonia do concreto na constru-
ção civil?
Paulo Camillo –
Não enxergo ameaça
nesse sentido, mas sim uma acirrada com-
petição entre materiais. O cimento em si
não possui substituto, mas os sistemas
construtivos sim. E os materiais concor-
rentes buscamocupar seus espaços. Com-
pete à nossa indústria e principalmente às
entidades representativas – ABCP e SNIC
– cuidarem em reforçar as qualidades dos
sistemas à base de cimento, no que se re-
fere a custo, qualidade e durabilidade. E
sabemos que o concreto goza do domínio
de sua utilização por parte do projetista,
do especificador, do construtor, e que o
material reúne as características que aten-
dem as expectativas da cadeia produtiva
da construção. É difícil imaginar um mun-
do sem cimento e concreto.
ABECE – Do ponto de vista tecnológi-
co, qual será a evolução do cimento?
Paulo Camillo –
Nas últimas décadas,
os aditivos químicos foram sem dúvida
a grande revolução dos concretos, por
conferirem aos mesmos, características
especiais, privilegiando a facilidade de
aplicação e a durabilidade, entre tantos
outros aspectos. E eles seguirão manten-
do esse papel de inovação, porque novos
produtos surgirão e novas propriedades
serão propiciadas ao concreto, no sentido
de aumentar produtividade e qualidade.
Posso citar os concretos autoadensável
– já bastante empregados – que tratam
de evitar as falhas de concretagem, cor-
riqueiramente chamadas de “bicheiras”
(concentração de vazios por falha de
preenchimento dos pilares, vigas e lajes),
e que, muitas vezes, se transformam no
que classificamos de vícios ocultos (não
visíveis a olho nu), e que podem levar, em
casos extremos, ao colapso das estrutu-
ras. Os concretos autocicratizantes ou au-
torregenerantes, produzidos com aditivos
cristalizantes ou cepas de bactérias, que
com o passar do tempo, colmatam fissu-
ras surgidas ou a seus próprios micros va-
zios internos, conferem maior impermea-
bilidade ao material e consequentemente
maior durabilidade frente a agentes agres-
sivos. Um terceiro são os concretos de
elevada resistência. Ganhos significativos
de resistência mecânica e de durabilidade
proporcionados pelos novos compostos
de cimento podem resultar em projetos
estruturais mais esbeltos sem pôr em ris-
co questões de segurança.
ABECE – Que avaliação faz dos proje-
tos estruturais elaborados hoje pela
engenharia brasileira?
Paulo Camillo –
A engenharia estru-
tural brasileira sempre teve reconheci-
mento, seja no âmbito nacional como
internacional, pela qualidade de seus
profissionais e pela comprovada ma-
terialização de obras altamente arro-
jadas. Apesar de dedicar-me há pouco
mais de 3 anos ao setor de cimento e
mais diretamente à cadeia produtiva da
construção que emprega o concreto, já
havia tido a oportunidade de perceber
que, por detrás de grandes arquitetos,
existem sempre excepcionais escritó-
rios e Engenheiros Estruturais. Posso
mencionar, sem destacar ou privilegiar
ninguém e com todo o respeito à clas-
se, a parceria de Oscar Niemeyer, com
Joaquim Cardozo (
in memorian
), ou com
Bruno Contarini, ou com José Carlos
Sussekind. Ou então a de Ruy Ohtake
com Mário Franco, dentre inúmeras ou-
tras “duplas” de destaque.
Soma-se a essa constatação que quan-
do da fundação da Associação Brasi-
leira de Normas Técnicas (ABNT) em
1940, das duas primeiras normas con-
duzidas pela entidade, uma delas era a
NB 1, Projeto e Execução de Obras de
Concreto Armado, chamada de “norma
mãe” da engenharia de concreto. Hoje,
decorridos quase 80 anos e tendo pas-
sado pelas necessárias revisões – todas
com ampla e irrestrita colaboração dos
ENTREVISTA
| PAULO CAMILLO PENNA
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