REVISTA ESTRUTURA
| SETEMBRO • 2017
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to sabem exatamente o que desejam da
trompa sob sua batuta: como deve soar,
se está afinada, se atende as exigências da
partitura, se entrou no compasso exato.
Assim sendo, creio que o ensino de
estrutura para arquitetos deve, funda-
mentalmente, dar-lhe condições de diá-
logo com o especialista e nunca assumir
seu papel na orquestra. Este objetivo
remete inteiramente à necessidade de
conhecer o dia a dia do arquiteto, seu
trabalho, seus desafios e responsabili-
dades profissionais.
Costumo citar um incidente profissio-
nal que ilustra perfeitamente este ponto:
há alguns anos estava desenvolvendo um
projeto que tinha certas peculiaridades
estruturais um tanto inusitadas e o tra-
balho era coordenado por determinado
arquiteto. Antes da primeira reunião co-
meçar, informalmente, ele me perguntou
o volume de concreto que eu imaginava
gastar. Achei a pergunta muito precoce
para o ponto do trabalho em que estáva-
mos e, talvez, tivesse ainda subestimado
sua capacidade de avaliar este aspecto
devido à especificidade do projeto. Para
minha surpresa ele sugeriu um valor (ex-
presso adequadamente sob a forma de
índice) que era absolutamente acertado
e pertinente. Ele não saberia calcular
uma estrutura, por mais modesta que
fosse, mas o número “grande” que o in-
teressava ele sabia avaliar perfeitamente.
Tenho certeza que também conhecia os
índices equivalentes de instalações, ar
condicionado, custos, etc.
Dentro desta visão, creio que o ensino,
ao longo de quantas sejam as cadeiras
dedicadas a este assunto, deveria ter o
seguinte perfil:
– Introdução
: Um conhecimento ex-
tremamente vasto, o mais abran-
gente possível, abusando mesmo do
conceito de “enciclopédico”, dos prin-
cipais tipos de edificações e obras de
construção (prédios, pontes, silos,
hangares, fábricas, etc), bem como
dos respectivos materiais (concreto
armado e protendido, aço, madeira)
e processos executivos (pré-fabri-
cação, alvenaria portante, execução
convencional, etc).
Creio que esta seria a “grande” cadei-
ra do curso em termos de estrutura,
uma vez que se enquadra totalmente
no conceito generalista que atribuí
acima ao arquiteto.
Vou dar um exemplo de sua impor-
tância. Frequentemente atendo alu-
nos no Ateliê fazendo projetos de
edificação urbana que optam por fa-
ze-las em estrutura metálica. Sempre
pergunto o porquê desta opção e,
quase invariavelmente, não obtenho
qualquer resposta consistente. Eu
acho isso espantoso, tal como tam-
bém o aluno não ter a menor ideia do
preço aproximado pelo qual os apar-
tamentos do seu projeto serão ven-
didos e, consequentemente, o perfil
sócio econômico do ocupante de sua
edificação!
– Cálculo de Esforços
: Esta parte do
currículo abrangeria inúmeras ca-
deiras do curso de engenharia, tais
como estática, hiperestática e resis-
tência dos materiais. Não cabe aqui
detalhar o currículo de tal cadeira,
mas creio que a ênfase deveria ser
em passar a percepção intuitiva e
sensível das deformações e dos es-
forços que atuam nas peças estru-
turais, tais como flexão, compressão,
tração, torção, flambagem, etc. Insis-
to: a ênfase é muito mais na qualifica-
ção e identificação do esforço do que
na sua mensuração e quantificação,
tal como ocorre nos cursos de enge-
nharia. Uma importante contribuição
a tal estudo seria o emprego do mo-
delo de estrutura com molas, atual-
mente comercializado.
– Madeira e Metálica
: esta discipli-
na – que tem a mesma abrangência
e designação no curso de engenharia
– deveria focar substancialmente na
parte da morfologia destas estrutu-
ras. Vejo, seguidamente no ateliê, os
alunos preocupados em saber como
“a viga encaixa no pilar”. Entendo per-
feitamente a preocupação deles. Reu-
nindo nesta cadeira os ensinamentos
advindos da cadeira anterior (cálculo
de esforços) e mantendo o mesmo en-
quadramento sensível e espontâneo,
creio que o objetivo seria alcançado.
– Concreto Armado e Protendido
:
teria basicamente o mesmo formato
das cadeiras anteriores. Gostaria, en-
tretanto, de salientar alguns pontos.
Estudo da compressão: creio que é ex-
tremamente útil ao arquiteto ser capaz
de pré-dimensionar um pilar, já que
– apesar de ser uma tarefa simples –
esta informação é vital para a Arquite-
tura que ele está desenvolvendo. Por
outro lado, não vejo o menor sentido
em ensiná-lo a calcular um pilar objeti-
vando obter a respectiva armação. Os
casos que a Norma Brasileira admite
de dimensionamento simplificado de
pilares são extremamente limitados e
o cálculo exato, com elaboração das
VALORIZAÇÃO PROFISSIONAL
| AS ESTRUTURAS E O ARQUITETO
O conhecimento das estruturas
por parte do arquiteto é fator
fundamental para o bom
exercício da profissão e facilita o
relacionamento com o projetista
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