35
tória pode sempre ser recontada, e, por
força dessa renovação submeter seu
objeto de pesquisa a um novo exame.
Por outro lado, porém, como recontar
essa história se, em nosso próprio cam-
po de atuação deixamos de analisar, pu-
blicar e com isso registrar nossos feitos
e contribuições?
É necessário que se faça distinção
sobre o tipo de registro e de contribui-
ção que se menciona aqui. Pesquisas
sobre materiais e suas características,
novas metodologias de cálculo e di-
mensionamento, resultados de ensaios
inovadores, debates sobre novos proce-
dimentos normativos a serem adotados
e outros assuntos correlatos têm sido
amplamente divulgados e
debatidos em nossos con-
gressos e publicações téc-
nicas. Não é esse o caso.
O que estamos deixan-
do de registrar em publi-
cações, de um modo ge-
ral, é o relato e análise de
projetos e suas soluções,
além de sua relação com
os projetos de arquitetura
que lhes deram origem.
Por que não publicar cro-
quis de anteprojetos e os
respectivos projetos finais
para que futuras gerações
possam estudar os cami-
nhos que levaram à me-
lhor solução? Poder-se-ia
assim estimular um cam-
po de pesquisas sobre
engenharia estrutural
para além da técnica
especificamente, prin-
cipalmente no que diz
respeito à sua evolu-
ção em paralelo com a
evolução da arquitetu-
ra, principalmente ago-
ra com o aparecimento
do parametricismo e o
desenvolvimento con-
junto de projetos e ar-
quitetura e estrutura.
Desnecessário
di-
zer que projetos de
vulto, cuja relevância
é incontestável são,
sim, publicados em re-
vistas especializadas,
como é o caso do pro-
jeto do Edifício Aqwa Corporate, cujo
texto, escrito por Suely Bueno, foi publi-
cado na Edição 6, de outubro de 2018,
aqui na ESTRUTURA. Mas onde estão os
registros dos demais projetos que, hoje
considerados pouco relevantes podem,
no futuro, contribuir para o debate téc-
nico ou mesmo histórico? Podem haver
ótimas soluções ali que poderiam ser
replicadas em outros projetos, além de
servirem como instrumentos pedagó-
gicos para o ensino nas universidades.
O julgamento dessa história ficará para
futuras gerações, que só poderão rea-
lizá-lo na medida da disponibilidade
de informações registradas, e essa é a
nossa obrigação.
As boas soluções de projeto, sejam as
demandadas pelo contingenciamento
dos projetos arquitetônicos ou mesmo as
negociadas com arquitetos que eventual-
mente alteram seus próprios projetos
chegando a um termo arquitetônico-es-
trutural comum, deveriam gerar análi-
ses que pudessem servir para consultas
futuras. Consultas de cunho histórico
e também técnico. Para isso as análises
precisam ser publicadas. Poderíamos
assim seguir o exemplo dado pelos pro-
fissionais de arquitetura que, seja na
formação acadêmica ou mesmo em sua
prática de projetos, estudam projetos
consagrados por seus pares em busca
das boas soluções, sem com isso perder
seu caráter de autonomia
e originalidade. O mesmo
se dá no campo da arte, no
qual é bastante comum a
reinterpretação da obra de
um artista consagrado por
outros artistas que, por
sua vez, geram a partir daí
suas próprias obras origi-
nais, como fez Picasso ao
reinterpretar Manet e sua
obra ‘’Dejeuner sur l´Her-
be’’, por exemplo (Figuras
1 e 2).
É urgente que passemos
a escrever. Escrever muito.
Publicar projetos e suas
boas soluções. Promover o
debate escrito entre pares,
por meio de análises des-
ses projetos, para que
possamos fazer disso
um hábito e assim ge-
rar conhecimento para
as futuras gerações
passando a ser nossos
próprios historiadores.
Nós contaremos a nos-
sa história.
Somente escreven-
do, registrando e di-
vulgando nossa histó-
ria, seja em projetos,
análise de projetos
ou mesmo análise de
processos de projetos,
poderemos
registrar
o presente para que
um dia possa se tornar
passado e, a partir daí,
projetar o futuro.
FIG. 1 – EDUARD MANET: ‘’DEJEUNER SUR L´HERBE’’, 1863, MUSÉE D´ORSAY,
PARIS, FRANÇA. FONTE: WIKIMEDIA COMMONS
FIG. 2 – PABLO PICASSO: ‘’DEJEUNER SUR L´HERBE’’, 1962,
SKEPPSHOLMEN, STOCOLMO, SUÉCIA. FONTE: WIKIMEDIA COMMONS